Sobre o Viver Criativo

A criatividade é um dos temas centrais da obra de Winnicott, médico e psicanalista inglês. Nesse contexto, não se fala em criatividade no sentido da criação de obras de arte, mas sim de uma criatividade do dia-a-dia, que pode ser traduzida como a capacidade que uma pessoa tem de viver e fazer as coisas à sua própria maneira.

Na vida de cada um de nós, há momentos em que somos mais ou menos criativos. Há vezes em que aproveitamos cada gota da realidade que nos é ofertada diariamente e damos a ela um toque a mais, proveniente dos nossos afetos, da nossa maneira de ser e mesmo da nossa fantasia. Somos capazes de relaxar, imaginar e sentir “eu estou vivo, eu sou eu mesmo”. Outras vezes, a realidade se apresenta de forma dura, até mesmo assustadora, e nos sentimos obrigados a reagir ou a nos submeter a ela. O risco que corremos é o de sentir que a vida não vale a pena ser vivida e que o sentido das coisas nos escapa.

Para algumas pessoas, viver criativamente é mais natural; em geral, são pessoas que desde o nascimento receberam os cuidados necessários para que crescessem saudáveis, confiantes de que é seguro realizar trocas afetivas com o mundo que as cerca. Acontece que nem sempre é assim: outras pessoas carregam consigo marcas de uma história de vida difícil, e sentem que é muito arriscado estar plenamente presentes na realidade – viver criativamente e à sua maneira parece distante, ou mesmo sem sentido.

Nesses casos, a psicoterapia apresenta-se como uma oportunidade de encontrar um lugar seguro onde acalmar-se e recuperar, ou mesmo inaugurar, a capacidade de viver criativamente. Ainda que a realidade seja difícil, há sempre uma parte dela que é maleável e guarda a possibilidade de algo novo.

Escrito por Paola Manzoli.

Referências:

Winnicott, (1971) O Brincar e a Realidade.Rio de Janeiro, RJ: Imago, 1975.

Imagem:

Pablo Picasso – Garota em frente ao espelho, 1932 – óleo sobre tela - 162.3 x 130.2 cm – Museum of Modern Art, New York.